quinta-feira, janeiro 13

Porquê insistir na pedra?

9 daguerreótipos:

Blogger Luis Gaspar said...

Sísifo, ou a ideia do eterno retorno como a única morte social. Fazer um blog não é isso mesmo? Levar a pedra lá acima, postá-la o melhor que podemos, para a deixar cair no esquecimento; depois colocamos a pedra de novo lá em cima, com outras palavras, e deixamos cair. Um dia temos a capacidade de dizer não, mas por momentos fomos sísifos.

1:20 da manhã  
Blogger saturnine said...

somos sempre, Ana. e mesmo que vamos só nós, é bem possível que também nós rolemos encosta abaixo. :) mas pelo menos, chegados lá acima, vemos nascer o dia azul, antes de a noite (re)cair. ;)*

(eu quase não tinha palavras para este post)

8:14 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

bem , há pedras e pedras... LOL, queria dizer:
há pedras que não são como as que encontramos no caminho, realidades independentes de nós, que podemos evitar, contornar, ou nas quais até podemos tropeçar e levantarmo-nos de seguida, mesmo que com dificuldade.
há pedras que são parte de nós, se tornam parte de nós. seria muito difícil desfazermo-nos delas, mas talvez, pelo menos, as pudéssemos arrumar a um canto ou aprender a alterar a nossa maneira de lhes sentirmos o peso ? já estava a imaginar aquela filosofia (zen?) das artes marciais (algumas?), aquele gesto de quebrar um tijolo com a mão despida sem sentir a dor ou minimizando-a, quero dizer, uma forma de desprendimento -

margem

8:51 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

entretanto, lembrei-me de uma leitura que fiz há imenso tempo: ?O Mito de Sísifo ? ensaio sobre o absurdo?, de Camus e das palavras que me ficaram: logo no início, ?Só há um problema filosófico verdadeiramente sério: é o suicídio. Julgar se a vida merece ou não ser vivida? e no capítulo sobre o mito, ?É preciso imaginar Sísifo feliz?.
não sei se entendi bem Camus, mas parece-me que, segundo ele, o facto de Sísifo ter consciência do peso que carregava, do sofrimento que era fazê-lo, e do absurdo (inutilidade) dessa tarefa, e executando-a mesmo assim, de algum modo, estaria a assumir o seu ?destino?, a sua vida, a optar pela vida, fosse ela qual fosse; e isso seria uma espécie de vitória. mas, como digo, não sei se entendo bem o que queria dizer, hei-de reler esse capítulo.

margem

8:58 da tarde  
Blogger saturnine said...

de certa forma é isso mesmo, margem. para Camus, o suicídio é uma fuga. e a fuga aniquila o absurdo do homem perante si próprio. a questão está toda em passar do ponto em que nos perguntamos se a vida tem algum sentido por que valha a pena iver, até ao ponto de percebermos que a vida vale a pena precisamente por não ter qualquer sentido. ou como diria Nietzsche, passar do ponto em que nos socorremos da consolação metafísica até ao ponto de mandar a própria metafísica para as urtigas.

por isso rolamos a nossa pedra montanha acima, montanha abaixo, porque assim é a nossa vida. não nos resignamos nunca, e revoltamo-nos sempre que ela se nos escapa, mas nem por isso fugimos à tarefa de empurrá-la. :)

9:42 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

obrigada, claire, esclaresceste-me algumas coisas. :)

mas continuo intrigada com a perspectiva de Camus, filosofia não é o meu forte e tendo sempre a pensar mais do que um ponto de vista: a coragem de Sísifo residiria, então, na sua aceitação passiva da vida tal como se lhe apresentava, sem querer mais do que isso, sem pensar alternativas, sem ter esperanças, como se se tivesse desprendido de si mesmo ao ponto de se ver e ver a sua vida com indiferença e poder dizer que tudo está bem, até porque a revolta e a não-resignação se limitam ao seu íntimo, não se exteriorizam, passivas elas também (estive a reler esse capítulo). venceria o destino, os deuses, o castigo, pela indiferença, pelo desprezo, pela redução da tarefa-castigo-vida a uma banalidade mecânica. já o suicídio seria fuga, e por oposição, cobardia e derrota perante a vida e os deuses (não teria conseguido cumpri-la nem estar à altura do que esperavam dele).

mas não será possível analisar de outra maneira? porque não pensar que, sendo consciente e aceitando a vida nesses termos, não passa de um cobarde que não arrisca nada, nem uma tentativa sequer de mudança? e porque não pensar que optar conscientemente pelo suicídio (já que são as duas alternativas de que Camus parte para as dissertações) pode ser um acto de coragem, é a resignação e a revolta feitas acção, é alterar os limites da sua liberdade individual, é uma agressão (e não uma fuga) ao que os deuses lhe impuseram?
em qualquer uma destas duas alternativas, poder-se-ia imaginar Sísifo feliz.

agora, não há outras alternativas, além de aceitar a vida como ela nos é ou de nos suicidarmos? e arriscar, mostrar exteriormente a revolta, alterar a rotina - uns dias não sobe, outros fica lá em cima e não desce de imediato, outros sobe sozinho, outros abre o olhar ao seu redor e segue outros rumos, e por aí adiante? claro, não seria feliz. qualquer processo de abertura, dúvida, sobressalto, experimentação, aventura, revolta, atenção, interrogação, espanto, amor, ódio, inibe aquela sensação de segurança que a rotina ou uma decisão definitiva nos podem dar. mas seria muito humano...
Camus considera Sísifo o mito do absurdo, i.e., do homem absurdo. como mito, talvez retrate realmente muitos homens, muitas vidas, mas não todas certamente, porque ser-se humano é isso também, mas não só. por isso também há muitas vidas infelizes e muitos homens inquietados que não conseguem dizer: está tudo bem.

margem

11:18 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

ooops... desculpem a extensão do post (começo a divagar, confundo-me nas ideias...)

margem

p.s.- num post acima, as aspas voltaram a aparecer como interrogações, porque será?

11:25 da tarde  
Blogger Paulo said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

12:24 da manhã  
Blogger Paulo said...

"p.s.- num post acima, as aspas voltaram a aparecer como interrogações, porque será?"

A gerência informa que pouco percebe destas coisas.

12:26 da manhã  

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