segunda-feira, março 7

Sha-la-la-la, man


Lou Reed | Street Hassle | 1978


Mais do que uma peça de memorabilia, Street Hassle regressa-me aos ouvidos e ao cérebro e continua a tocar-me num fusível qualquer, que não consigo nem quero explicar. Veio parar-me às mãos, pela primeira vez, por alturas do décimo ou décimo primeiro ano do liceu (quem lê isto sabe o que é o liceu, assim uma espécie de ensino secundário com menos sapatilhas de marca). Foi-me emprestado e depois oferecido por um amigo, para quem o Lou Reed devia ser "um drogadito de Nova York" ("de NY" acrescentei agora, para o meu amigo ele até podia ser suiço...). Ofereceu-mo porque tinha acabado de comprar um leitor de CDs (ele) e suponho que por causa da cara que fazia, de cada vez que lhe descrevia aquele som, tal como o ouvia.
Vinil, claro, e já vinha com a capa gasta e ratada nos cantos. Sem protecção exterior, a rodelona entrava por um lado e saía pelo outro. Só de olhar para ele (estou a vê-lo, agora) arrepiava-me: dezenas de riscos, poeira entranhada, microorganismos milenares em hibernação criogénica, espirais fora.
Não foi o suposto proto-manifesto sónico do Punk e da New Wave que me atacou o cérebro, nada de etiquetas (Trás-os-Montes estava muito longe dessa epistemologia, e além do mais, o Punk ou a New Wave nunca o igualaram), foi a música que tinha lá dentro. Adorei aquilo que, anos mais tarde, associei aos loops em crescendo hipnótico dos Velvet; o som sujo, arrastado, pesado com pessoas lá dentro, o desencanto apaixonado (porra, isto existe?) da voz, os poemas do amor, do ódio, do spleen. Lou Reed a pensar-se e à personagem, como noutros momentos.
O que eu curti o disco. Usava-o para descansar do space e do prog-rock que então respirava. Passava-o no "Rádio Pirata", numa frequência que já não o era (pirata) desde há pouco tempo, independentemente da batata-frita que se lhe tinha infiltrado nas vísceras, ao longo dos anos. O disco tinha vindo de um amigo de uma amiga de um amigo de uma irmã do meu amigo. É muito estranho, ouvi-lo agora sem esses sons parasitas. Não é o mesmo álbum, mas é tão bom como o outro.

2 daguerreótipos:

Blogger mr pavement said...

impertinência ou o mesmo comprimento de onda, tanto faz. esta manhã, tropeçar no cão foi a antevisão de um perfect day.

cumprimentos.

6:29 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

O Reed sempre me inquietou. Sinto que há nele um abismo ao qual nunca terei acesso. E há lá coisa mais atraente do que precipício?

11:46 da tarde  

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